quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A identidade social e a identidade desportiva

A competição entre dois clubes não é apenas uma avaliação das capacidades de rendimento desportivo entre os que competem. É, também, um modo de se confrontarem e avaliarem as entidades que os competidores representam. E, muitas vezes, quem vence não é penas o clube, mas a cidade, a região ou o país.
O desporto foi sempre meio e expressão de afirmação de identidades. E essa uma das razões para o facto de, muitas vezes, as dinâmicas identitárias ultrapassarem as desportivas e estas serem contaminadas por outras dinâmicas sociais.
Numa análise mais atenta deste problema é curioso verificarmos que, estes traços singulares do desporto, não se diluem mesmo quando o desporto tende a reflectir o processo de globalização e emerge no contexto de uma cultura de massas como objecto de consumo transversal. Ao invés, aproveita essa dinâmica para acentuar e reforçar a sua singularidade identitária. É ao mesmo tempo bandeira e vitrine para além do espaço territorial que o contextualiza.
A utilização do desporto como meio de afirmação e expressão de identidades locais ganha deste modo um novo fôlego ao ser transformado numa espécie de linguagem universal que se constitui, à escala global, como o melhor objecto de comunicação.
Em certas circunstâncias, uma vitória desportiva assume também um lugar legitimador na retórica política, servindo interesses e objectivos que estão muito para além do âmbito desportivo. O que torna a razão identitária facilmente manipulável e um caminho apetecível para todo o tipo de populismos.
A matéria tem sido objecto de vários estudos no domínio das ciências sociais. A relação do desporto com os meios de mediação social, particularmente a televisão, reactualiza o tema.
No espaço europeu, a livre circulação dos praticantes desportivos, interroga-nos também, como será possível, no futuro, manter este registo identitário, quando crescentemente os praticantes tendem a não ter qualquer relação (de nacionalidade, de língua, de cultura) com aqueles que os apoiam.
O desporto tende a constituir-se como uma metalinguagem capaz de unificar e legitimar o que a língua nacional (factor primeiro de identidade) perdeu.
Ontem*, entre atletas com várias nacionalidades de um lado e de um outro, o que se disputou foi um a competição entre uma equipa inglesa e uma portuguesa. E foi, exceptuando critérios clubísticos, o que definiu as identidades em confronto.

* Refere-se ao dia 8/3/2006, e ao jogo entre Liverpool e Benfica, onde os portugueses ganharam por 0-2.


(Retirado de "http://estadosdalma.blogs.sapo.pt/1413.html")

1 comentário:

Ricardo Costa disse...
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